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O CIÚME, NO RELACIONAMENTO ABERTO

    CAP. 6 – AMOR E LIMERÊNCIA

    Entre o amor e a paixão (limerência)

              “O amor é cego” refere-se à paixão, não ao amor.

              A queda da serotonina cria um estado similar ao TOC.

              Dorothy Teenov chama a paixão de limerência.

              A paixão acaba – e as pessoas vão atrás de uma nova sensação de limerência, pois pensam que, se não a sentem mais, há algo de errado com sua relação.

    É possível amar mais de uma pessoa?

              Depende da definição de amor.

              Algumas pessoas amam sem nunca ter sentido a limerência.

              Para a autora, o amor por várias pessoas é possível – amor no sentido de afeto etc. – pais, filhos etc., cada um de uma forma diferente. Como também é possível sentir desejo sexual por várias pessoas… Entretanto, é difícil sentir a limerência por mais de uma pessoa ao mesmo tempo.

              Um estudo entre jovens, nos EUA, mostrou que um quarto já se afeiçoou por mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Como eram monógamos, isto foi um problema, ter de escolher.      

    O que o amor não é

    – Amor não é controlar o outro

              Controle é mais provavelmente medo.

    – Amor não é dependência excessiva

              Se o amor do outro me dá um senso de valor, sem a pessoa perderei este valor. Se não posso viver sem ele, dependo dele completamente.

              Se não preciso de nenhum dos meus parceiros, isto significa que estou com  eles porque quero, e isto é a verdadeira expressão do meu amor por eles.

    – Amor não é tentar mudar a outra pessoa

              Isto é desrespeitoso. Não funciona e é frustrante para os dois.

    – Amor não é, necessariamente, ciúmes

              Não sentir ciúmes depende da segurança que sentimos com a relação, da nossa auto-confiança – e de querermos ver o outro feliz.

              O ciúme não nasce do amor, mas do medo da perda – o que é algo completamente diferente.

    – Amor não é ego

              Se eu vejo o outro a partir do prisma de porque o escolhi (porque é bonito etc.), isto não é amor. Estou usando a pessoa como um troféu.

    Então o que é o amor?

              Amor é suporte. É querer o melhor para o outro. É aceitação. Amor é focar no que o outro tem de bom. Amar é estar livre para estar ao lado daquela pessoa.

              Apego é diferente. Apego traz sofrimento. Apego é querer que o outro me faça feliz. Amor é querer fazer o outro feliz – mesmo que isto não me inclua.

              O rabino Abraham Twersi, em um vídeo, chama isto de “amor de peixe”. Quando dizemos que amamos alguém, é quase como dizer que “amamos peixe” – os benefícios que aquele peixe, morrendo, nos traz. Devemos mudar nossa mente, de dar àqueles que amamos, mas amarmos àqueles a quem doamos.

              Porém isto é quase não-humano, já que também temos as nossas necessidades. O amor incondicional parece uma meta inalcançável. Sempre há algumas “condições”. Ou teria de amar a todos – porém gosto desta pessoa por isto e isto.

    Limerência no poliamor e em relações abertas

              Certas situações criam as dificuldades que Jack Morin diz que acendem a paixão – como a impossibilidade de encontrar todos os dias, ou de ser promovido a relacionamento “oficial”.

              O que tenta colocar obstáculos tem de estar consciente disto, ao criar a “síndrome de Romeu e Julieta”.

              Alain de Botton diz que muitos se mantém monógamos ao racionalizarem que aquela moça linda e simpática do supermercado logo se tornará uma pessoa comum, caso o interesse se consuma – é apenas um ser humano.

              Porém somos humanos – e ao nos apaixonarmos de verdade, perdemos o foco – e isto pode afetar profundamente “a pessoa que está em casa”. Porém isto pode ser bom, trazendo novas conversas e vitalidade. Por outro lado, pode ser ruim até para quem se apaixona, por não ser correspondido etc. Mas o parceiro também pode apoiar nesta situação: “É quase como se tivéssemos dois corações.”

              É por isto que muitos casais que abrem o relacionamento tentam colocar como regra o não-envolvimento com outros.

    Restringindo o amor e se apaixonando

              Porém até swingueiros se apaixonam por outros.

              A proibição de se apaixonar não funciona. Mesmo para pessoas que acreditam na monogamia e julgam os traidores. Mesmo para quem já traiu.

              A atração física também não se controla.

              Apesar disto, sentimos culpa – por algo incontrolável. Ou melhor: talvez algumas situações sejam controláveis, por algumas pessoas – isto é, no começo etc. Mas desejamos controlar?

              Para a autora, estas “conexões” não são incidentais, apontam para um certo desejo, “um certo lado de nós mesmos que queremos evoluir, auto-descobrir”. Podemos até analisar isto e apenas trazer esta necessidade para nosso relacionamento.

              Tennov aponta que mesmo quando uma paixão acaba desenvolvemos novos interesses e queremos ser pessoas melhores.

              “Apaixonar-se não é acidental, mesmo que seja hormonal.”

              É uma das melhores, se não a melhor, coisa do mundo – e não deveríamos querer nos privar – ou a pessoa que amamos – disto. Pode ser a pior sensação do mundo para o outro, mas se ele entender que seu amor por ele não morreu… Os sentimentos são dinâmicos – como quando nasce um filho novo.

              O primeiro pode ser abandonado. Por quê?

    – um nunca quis mesmo uma relação aberta, a relação estava ruim  para ele, não foi embora por medo – a abertura foi apenas um catalisador

    – há muitos problemas dentro da relação inicial, lá fora é só alegria

    – apaixonou-se e “perdeu os sentidos”; geralmente no primeiro ano da abertura, a limerência;

    – game changer, um raro match perfeito – que só o fim da limerência dirá se é real

    – o novo é monógamo

              O que fazer para evitar?

    1. Invista na relação existente. Tente consertar os problemas.

    2. Seja racional. A paixão passa, os defeitos do novo aparecem.

    3. Às vezes acaba mesmo…

    4. A relação não precisa acabar por completo. Não é um abandono, é uma mudança de status.

    5. Mude sua mente. Valorize dar a liberdade alheia.

              Com o tempo, o novo bebê deixa de ser novidade, vira apenas mais um filho.

              E quando tudo isto passar, você será amada por dois e será completa. “Eu e os homens da minha vida.”

    CAP. 7 – CIÚMES

              Comumente a responsabilidade pelo ciúmes sentido é repassada para a pessoa que o causa, que deve mudar então seu comportamento.

              Parte da existência da monogamia é uma tentativa de fazer o ciúmes desaparecer.

              E como parece um sentimento razoável, parte da sua manifestação é considerada aceitável pela sociedade.

              De acordo com Anita Wagner, uma coach do poliamor, o ciúme existe por razões culturais – além de problemas vindos do nosso passado e de dentro da relação atual.

    O aspecto biológico

              Há um debate sobre se o ciúme é totalmente cultural ou se tem razões biológicas. Sem resposta definitiva.

              Há animais que demonstram ciúme e outros não.

              O bicho-pau, um inseto (Trachythorax sparaxes) têm sexo que dura até dez semanas. Precisaria tanto?

              Várias sociedades lidam de maneira diferente.

    O aspecto social

              Há desde o sentimento real até a “guarda da honra”.

              Exemplos de restrições culturais que justificam o ciúme:

    – a crença que é impossível amar duas pessoas

    – a crença de que sexo fora da relação é traição ou imoral – chamam os relacionamentos abertos de “traição com permissão”, o que seria uma contradição

    – a ausência de ciúme é prova da falta de amor e o contrário também

    – a crença de que quem ama não precisa de nada mais

    – a crença de que quem precisa de mais relações sexuais tem a síndrome de Peter Pan

    – a crença de que o ciúme é inevitável e que a culpa é do outro

    – a crença de que o outro pertence a mim

    – a crença de que o amor é um recurso finito

    – a crença de que, sem aquela pessoa, eu não serei ninguém

              O antropologista Ralph Hupka estudou 92 culturas e concluiu que o ciúme se manifesta mais intensamente em sociedades que enfatizam a propriedade, a descendência, que requerem a formação de casais. Tudo depende daquela pessoa em que estamos – assim, o medo existencial da ameaça à nossa sobrevivência se impõe.

              Entre os nativos americanos Pawnee, o homem que pedisse um copo de água a uma mulher comprometida poderia ser assassinado, no século 19.

              Os esquimós Ammassalik dão suas mulheres aos visitantes.

              Entre os Toda indianos, um homem que quer ter um caso com uma mulher casada precisa pedir permissão a todos os maridos desta.

               Hupke clama que o ciúme não é uma emoção, mas uma situação específica. A emoção sentida é medo.

              A sociedade reenforça isto com leis e leis não escritas.

              Leis que permitiam ao marido matar a esposa pega em flagrante existiram na França (desde o Código Napolênico) e na Itália até há algumas décadas.

              Uma “prova” de quando é cultural é a reação à primeira saída da mulher versus algo que já se tornou rotineiro, em casais que abriram a relação.      

    Ciúme como um testamento para os nossos demônios internos

              Pessoas em NMC aceitam o ciúme como uma necessidade de entendimento, oportunidade de crescimento. E que a culpa não é do outro, o sentimento é seu.

              A possessividade é mais comum em relações onde falta a verdade.

              O ciúme pode atacar até mesmo aqueles que traem ou que propuseram a abertura da relação. E agora se sentem hipócritas. Muitas vezes queriam a relação aberta para si, para curtir a sua liberdade, a diversão que os aguardava. Então querem fechar a relação novamente para voltarem a se sentir seguros.

              Paradoxalmente, entendemos facilmente que o outro não nos completa – porém temos grande dificuldade de aceitar o inverso.

              Talvez tenha a ver com sentimentos da infância, quando para nossa mãe éramos tudo. Quando nasce um irmão, sentimos um medo “real”: se formos abandonados, não poderemos sobreviver.

              A chance é: ou recebemos e damos a liberdade, ou os dois renunciam a ela – ou, o que é mais comum, um rouba, ao custo de sua integridade, o que é o cenário mais comum, na prática.

              Todos querem viver a vida ao máximo; ninguém quer perder o controle (sobre o outro).

              Malka Feldshtein, terapeuta sexual e em relação aberta com seu marido: “A natureza humana não é monógama – mas seu ego é.”

              O importante é não negar o sentimento. Ele não irá embora assim. Pedir por ajuda ao parceiro pode ser uma saída. Confiar no cuidado e no amor do outro é, muitas vezes, uma decisão consciente – e diminui muitos problemas, não apenas o ciúme.

              Se não conseguimos fazer isto, temos de voltar à terapia se não confiamos nele, na relação ou temos um problema em confiar nas pessoas.

              Para a autora, não existem emoções “negativas”. Elas apenas nos dizem o que nos falta. São emoções “amigas”, como a dor física.

              Um grande alívio para o ciúme é inflarmos a nossa crença em nós mesmo. Autoestima etc.

              Muitas vezes o ciúme vem de um trauma pequeno, resolvível – como por estar acima do peso.

              Entender o quanto é único. Outro pode ser mais bonito, outro mais rico etc. O outro também tem suas desvantagens. Não estamos competindo com ninguém, se fomos previamente escolhidos.

              A relação também é única. Com diferentes pessoas (amigos etc.) estabelecemos diferentes tipos de vínculos. Com nossos parceiros amorosos também – sexo, amizade, finanças, filhos, interesses em comum etc.  

              Relações monógamas tentam trazer todos os interesses para uma pessoa apenas. NMC não significa incapacidade de comprometimento ou medo de intimidade, significa que querem experimentar cada relacionamento em todas as suas possibilidades – não necessariamente sexuais.

              A cultura mono-normativa danifica o potencial destas relações extra-par.

              Dossie Easton, de “The Ethical Slut”, diz que deveríamos querer sentir o ciúme – e enfrentá-lo.

    Olhar mais para dentro de nós do que para fora.

              “Se você ama alguém, deixe-o livre. Se ele voltar…”

              Os poli inventaram uma palavra oposta: compersão. Que a autora admite não sentir sempre.

    CONCLUSÃO

    Estando aberto para o mundo

              Pessoas em RNM tornam-se mais abertas para o mundo de uma maneira geral – até mesmo em suas carreiras etc.

    O poder da dúvida

              Para os chineses, comer cachorros é normal.

              A própria cultura em que vivemos muda, e muito, às vezes rapidamente.

              “Não penso que querer liberdade seja imaturo; penso que seja uma necessidade humana básica.” “Autonomia é uma necessidade humana básica.” A ausência dela pode levar à doença mental e morte.