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CIÚME: BOM OU RUIM?

    CAPÍTULO 2 – O PARADOXO DO CIÚME

              Até estudar o ciúme pode ser perigoso. Um colega do autor apanhou ao provocar um marido ciumento, em um estudo. Mas o autor se interessou porque acredita que é uma emoção muito poderosa injustamente negligenciada. Alguns colegas disseram que a ele que o ciúme não importa tanto porque é uma mistura de emoções mais básicas, como a raiva. Outros disseram que é apenas um sintoma de outro problema, como a imaturidade emocional.

              Entretanto, observa, o ciúme surge em pessoas completamente normais e “maduras”. E que é uma reação tão básica quanto lutar ou fugir.

    O paradoxo do ciúme

              Santo Agostinho: “Quem não sente ciúme, não ama.” Quase metade das pessoas em um estudo concordaram que o ciúme é uma consequência inevitável do amor. De fato, a maioria das pessoas considera a falta de ciúme do parceiro como um sinal de falta de amor.

              Eugene Mathes conduziu um estudo entre casais de namorados, onde aplicou uma escala de ciúme. Sete anos depois, 25% dos casais se casaram – 75% se separou. Entre os que casaram, o índice de ciúme era maior naquela primeira avaliação. Embora a amostra do estudo seja pequena, pode ser um indício de que o ciúme seja “necessário” para a formação de pares de longo prazo.

              Embora outro estudo, entre estudantes universitários, mostrou que 33% deles colocava o ciúme como um problema nas suas relações.

              O paradoxo do ciúme é este: pode unir, mas pode ser muito problemático. O. J. Simpson afirmou: “Digamos que eu tenha matado ela. Teria sido por amá-la demais, não?”

    O significado do ciúme

              O inglês “jealousy” vem do francês “jalousie”, que vem do latim “zelosus”, que vem do grego “zelos”, que significa “fervor, desejo intenso”.

              (Mas em francês significa também veneziana e há quem acredite que possa ter a ver com o ato de espiar.)

              O ciúme é dito como “o eterno triângulo” pois sempre há uma terceiro elemento, real ou imaginário.

              O ciúme pode ser definido como um estado (pois é transitório) que surge geralmente em relações em que estamos investidos (é raro o ciúme de “ficantes”), em face a uma ameaça, comumente levando a alguma ação para debelar esta ameaça.

    Mitos sobre o ciúme

              Há quem defenda que o ciúme seja um construto social – derivado do sexismo, que diria que o homem tem direito de controlar a sexualidade da mulher. O estudo transcultural desmonta rapidamente esta ideia.

              Outros acreditam que o ciúme seja um fenômeno do capitalismo. Pessoas são posses. Novamente, o estudo transcultural…

              Uma teoria mais aceita diz que o ciúme é sinal de imaturidade, baixa-autoestima etc.

              Outra, por fim, talvez uma extensão da terceira, é que o ciúme, ao menos o extremo, é uma doença. Embora de fato o ciúme possa surgir em situações como traumas cranianos, isto não é o que ocorre no dia-a-dia.

              E existem sim diferenças locais. Os Ache, no Paraguai, fazem uma espécie de “clube da luta” entre o ciumento e o alvo do ciúme. Entre os Kipsigis no Quênia, o hábito é o marido traído exigir o “estorno” do valor pago pela esposa.

              Mesmo os esquimós Ammassalik, ditos como não-ciumentos, às vezes matam a esposa infiel. Os samoanos também já foram descritos como não-ciumentos, mas a realidade dos fatos não é assim. Nunca foi encontrada uma cultura onde o ciúme não exista.

    A evolução do conflito entre os sexos

              A evolução das espécies nasce de uma competição pela vida e pela reprodução. O maior inimigo de uma pessoa, assim, talvez não seja um leão, mas alguém do mesmo sexo.

              Ao mesmo tempo, nosso parceiro é a única pessoa no mundo que tem um mesmo interesse que o nosso: o sucesso da cria.

              Entretanto, um estudo do autor mostrou que as pessoas citaram nada menos que 149 ocasiões em que um sexo entra em conflito com o outro! (Por razões evolutivas óbvias, a mulher se incomoda muito com sexo forçado; o homem, com sexo negado.)

              A união pode ser frágil – e há uma lógica evolucionária para isto.

              Conflitos sobre uso de recursos são especialmente comuns.

              A grande ameaça, entretanto, é a infidelidade ou abandono. É improvável que o amor paterno tivesse evoluído se os homens não tivessem alguma segurança sobre a paternidade.

              Assim como a existência de filhos prévios comumente diminui o valor de mercado de uma pessoa – temos aqui mais uma explicação para o “amor”. (E as taxas de abuso em crianças “herdadas” é 40 vezes maior.) (Ver casos Isabella Nardoni, garoto Henri etc.)

              Assim, se não tivessem surgidos mecanismos de proteção à união, talvez tivéssemos entrado em extinção, já.

              O ciúme, portanto, pode ser visto de uma forma até benéfica: um mecanismo de proteção à união.

    Emoções como sinais de uma interferência estratégica

              Para muitos, as emoções são o oposto da razão, levando esta a tomar decisões burras. As emoções seriam relíquias indesejáveis de um passado longínquo, de antes do surgimento da razão. Assim, psicólogos chamaram raiva, angústia, ciúme etc. de “emoções negativas” – as quais, obviamente, deveriam ser controladas.

              Para o autor, entretanto, tais emoções não são negativas, e sim adaptativas. Surgiram para lidar com “interferências estratégicas”. O medo de cobras, por exemplo, nos torna mais vigilantes, nos faz congelar ou fugir etc. Humanos que não tinham medo destes animais não deixaram descendentes. Os medos mais comuns dos humanos são óbvios: cobras, aranhas, altura, escuro e estranhos – mesmo em crianças, independente das experiências. Embora hoje seja mais provável morrer atropelado, não desenvolvemos medo de carros. Bebês demonstram medo de altura e de estranhos exatamente quando começam a engatinhar.

              Entre os 9 e 13 meses, surge a ansiedade de separação.

              Medos, enfim, são um equivalente físico da dor – incômodos, mas úteis.

              –

              Mulheres se chateiam com homens que buscam sexo rápido – eles interferem com a estratégia delas. O contrário também é válido.

              Este sentimento, de contrariedade, é como o medo – serve a propósitos adaptativos. Inclusive para preservar a reputação da mulher.

              Já o ciúme é uma emoção bem mais complexa do que a simples raiva. Vários sentimos podem acompanhá-lo, inclusive a excitação sexual!

              O ciúme também é sinal de interferência estratégica que serve a vários propósitos – inclusive a defesa da honra do afetado. Mulheres com ciúme extremo, em um estudo, aliás, se mostraram menos preocupadas com os detalhes de uma eventual traição do que com a humilhação pública ou frente à rival.

              No ciúme há tantos possíveis sentimentos quantas possíveis ameaças envolvidas, que são muitas.

              Portanto, o ciúme só pode ser considerado, a priori, “negativo” porque é uma emoção desconfortável, conclui o autor…

    Combatendo ameaças: o design da defesa

              Um fenômeno como o ciúme pode ser desencadeado por inúmeros inputs, como um sorriso dado por nosso parceiro para determinada pessoa. Este input irá gerar outputs também variados.

              Entre uma coisa e outra, input e output, há o processamento da informação. “Estarei vendo coisas?”

              A primeira linha de defesa é o aumento da vigilância.

    A espiral co-evolucionária

              As mulheres querem homens capazes de cuidar delas. Os incapazes não reproduziram; instala-se uma luta para aumentar esta capacidade – ou para fingi-la. As mulheres precisam ficar mais espertas. O que faz os homens ficarem mais hábeis em falsear. Etc.

              Quando uma mulher pede a um homem para não ir jogar bola com os amigos, está apenas testando sua capacidade de comprometimento com ela.

              O ciúme surge no meio da espiral evolutiva do amor, como uma proteção contra o risco de perda da pessoa amada. Entretanto, tanto quem flerta com este parceiro quanto o próprio parceiro aprenderam também a mentir melhor… Uma clássica: “Acho que ele é gay!”

              O ciumento, então, passa a ficar ainda mais vigilante – qualquer sinal é um sinal. Etc.

              Aqueles que não desenvolveram esta sensibilidade não deixaram muitos descendentes.

              Já o que provoca o ciúme também aprendeu a ler o sentimento – como algo bom. Quanto mais, maior o comprometimento. Até certo ponto: o ciúme excessivo é visto de forma negativa – raramente algo bom vem disto.

              Esta visão positiva do ciúme em quem o provoca cria um reforço positivo: se a sensação é boa, irei fazer mais e mais. Há alguns ganhos extras com isto: mostro ao outro meu valor. É por isto que as redes sociais causam tantos problemas atualmente.